Na Europa, a extrema direita se aproxima de Israel

Imagem: Lara Jameson
Whatsapp
Facebook
Twitter
Instagram
Telegram

Por FLÁVIO AGUIAR*

O caso mais contundente do apoio da extrema direita europeia a Israel veio do espanhol Vox, que se declara herdeiro do franquismo falangista e até dos Cavaleiros Templários da Idade Média

A guerra no Oriente Médio está provocando uma maior inclinação do eixo de grande parte da extrema direita europeia para o lado israelense do conflito.

O caso mais chamativo desta tendência é o da líder do Rassemblement National [Reunião Nacional] francês, Marine Le Pen. Em declarações à imprensa e no Parlamento Nacional ela manifestou seu apoio irrestrito à sobrevivência de Israel e o seu “direito à autodefesa”.

Jordan Bardella, o presidente do Rassemblement National, complementou: “Para muitos judeus franceses o Reunião Nacional representa um escudo contra a ideologia islamista”.

Críticos da líder francesa veem neste seu movimento uma tentativa – que qualificam como “demagógica” – de apagar o passado antissemita do partido, quando se chamava “Frente Nacional” e era liderado por seu pai, Jean-Marie Le Pen, condenado em processos por minimizar o Holocausto. Apontam que ela está mirando a eleição presidencial de 2027, quando o atual presidente, Emmanuel Macron, não poderá concorrer, uma vez que a Constituição francesa proíbe o exercício de mais de dois mandatos presidenciais consecutivos. E lembram que de eleição em eleição os votos em Marine Le Pen vem crescendo continuamente.

Na Itália, o líder do partido Lega, Matteo Salvini, igualmente de extrema direita, também se posicionou ao lado de Israel numa manifestação por ele convocada na cidade de Milão. Foi cauteloso ao afirmar que “o inimigo não é o Islã, mas o extremismo islamista”.

Na Hungria não houve surpresas. O primeiro-ministro Viktor Orbán é um antigo aliado não só de Israel, mas da direita israelense, e um ardoroso defensor da “civilização europeia”. E não tardou em declarar que qualquer manifestação que apoiasse o “terrorismo do Hamas” seria proibida. Assim mesmo, destacou que deveria haver ajuda humanitária à população civil de Gaza.

O caso mais contundente deste apoio de extrema direita a Israel veio do espanhol Vox, que se declara herdeiro do franquismo falangista e até dos Cavaleiros Templários da Idade Média. O secretário-geral do partido, Ignacio Garrido, acusou o governo socialista do primeiro-ministro Pedro Sanchez e Yolanda Diaz, a líder do Sumar, uma coalizão de esquerda que apoia o governo, de supostamente “justificarem” os ataques do Hamas.

O líder do Vox, o deputado Santiago Abascal, chegou a dizer que “se possível devia-se matar os terroristas antes que eles matassem inocentes”, numa tirada que lembra o filme Minority Report, em que potenciais criminosos eram “neutralizados” antes que cometessem seus supostos crimes. O Vox se comprometeu igualmente a apresentar um projeto de lei ao Parlamento proibindo a imigração proveniente de “países de cultura islâmica enquanto não se possa assegurar sua integração”, seja lá o que isto signifique.

Na Alemanha a situação se apresentou de modo um pouco mais complexo. No Bundestag, o Parlamento Federal, o líder do AfD, Alternative für Deutschland, Alexander Gauland, declarou que “o ataque do Hamas não atingiu apenas Israel, ele nos atingiu também; Israel é o Ocidente numa vizinhança que rejeita e combate o Ocidente”. Já o presidente do partido AfD, Tino Chrupalla, condenou o ataque mas ressaltou que o momento é “para a diplomacia”. Outros membros do partido criticaram esta sua declaração, inclusive um grupo auto-intitulado “Judeus com o AfD”. Deve-se ressaltar que recentemente membros do partido foram acusados e processados como defensores, simultaneamente, de antissemitismo e de islamofobia.

Uma observação: em grande parte, exageros retóricos à parte, estas posições de partidos de extrema direita na Europa não diferem substancialmente das posições de grande parte dos governantes europeus e de autoridades da União Europeia, embora estes últimos ponham mais ênfase nas preocupações humanitárias em relação aos civis de Gaza. Entretanto elas apontam para a busca de apoio mais amplo nos países onde aqueles partidos de extrema direita atuam.

Por outro lado, atividades racistas, sejam antissemitas, islamofóbicas ou outras contam com a participação de um sem número de pequenas células clandestinas, cujo comportamento frequentemente violento será certamente reforçado pela circunstância da guerra.

*Flávio Aguiar, jornalista e escritor, é professor aposentado de literatura brasileira na USP. Autor, entre outros livros, de Crônicas do mundo ao revés (Boitempo). [https://amzn.to/48UDikx]

Publicado originalmente no site da Rádio France Internacional


A Terra é Redonda existe graças aos nossos leitores e apoiadores.
Ajude-nos a manter esta ideia.
CONTRIBUA

Veja neste link todos artigos de

AUTORES

TEMAS

10 MAIS LIDOS NOS ÚLTIMOS 7 DIAS

Lista aleatória de 160 entre mais de 1.900 autores.
Jean Pierre Chauvin Luciano Nascimento Eliziário Andrade Ronald León Núñez Luís Fernando Vitagliano André Singer Antonio Martins Manchetômetro Érico Andrade Lucas Fiaschetti Estevez Carlos Tautz Daniel Costa Marcos Silva Benicio Viero Schmidt Marjorie C. Marona Liszt Vieira João Paulo Ayub Fonseca José Raimundo Trindade Eleonora Albano Francisco Fernandes Ladeira Bento Prado Jr. Lorenzo Vitral Sergio Amadeu da Silveira Luiz Roberto Alves Bruno Machado Andrew Korybko Alexandre de Oliveira Torres Carrasco Remy José Fontana Flávio Aguiar Gilberto Maringoni Celso Frederico Paulo Capel Narvai Anselm Jappe Vladimir Safatle Antonino Infranca Daniel Afonso da Silva Valerio Arcary Marilia Pacheco Fiorillo Fábio Konder Comparato Paulo Fernandes Silveira Ricardo Antunes Annateresa Fabris João Sette Whitaker Ferreira Igor Felippe Santos Alexandre de Freitas Barbosa Marilena Chauí Alysson Leandro Mascaro Leda Maria Paulani Flávio R. Kothe Tadeu Valadares Francisco Pereira de Farias Plínio de Arruda Sampaio Jr. Antônio Sales Rios Neto Paulo Martins Julian Rodrigues João Feres Júnior João Adolfo Hansen Daniel Brazil Denilson Cordeiro Samuel Kilsztajn Kátia Gerab Baggio Eugênio Trivinho Marcus Ianoni Michel Goulart da Silva Fernando Nogueira da Costa Osvaldo Coggiola Vanderlei Tenório Rubens Pinto Lyra Eduardo Borges Luiz Bernardo Pericás Elias Jabbour Leonardo Boff Leonardo Sacramento José Machado Moita Neto Yuri Martins-Fontes Airton Paschoa Walnice Nogueira Galvão Otaviano Helene Armando Boito Claudio Katz Renato Dagnino Alexandre de Lima Castro Tranjan Boaventura de Sousa Santos André Márcio Neves Soares Afrânio Catani Ricardo Fabbrini Tarso Genro José Costa Júnior Sandra Bitencourt Milton Pinheiro Bruno Fabricio Alcebino da Silva Alexandre Aragão de Albuquerque Ladislau Dowbor Matheus Silveira de Souza Mariarosaria Fabris Juarez Guimarães Marcos Aurélio da Silva Ricardo Musse Chico Whitaker Heraldo Campos Rafael R. Ioris Andrés del Río Luiz Eduardo Soares Eleutério F. S. Prado Mário Maestri Michael Löwy João Carlos Salles Berenice Bento Maria Rita Kehl Ricardo Abramovay José Micaelson Lacerda Morais Gabriel Cohn Michael Roberts Fernão Pessoa Ramos Everaldo de Oliveira Andrade Gerson Almeida Jean Marc Von Der Weid Chico Alencar Vinício Carrilho Martinez Carla Teixeira Ronald Rocha José Dirceu Rodrigo de Faria José Luís Fiori Luiz Marques Ari Marcelo Solon Henri Acselrad Celso Favaretto Marcelo Módolo Eugênio Bucci Luiz Carlos Bresser-Pereira Atilio A. Boron Caio Bugiato Ronaldo Tadeu de Souza Alexandre Juliete Rosa Paulo Sérgio Pinheiro Paulo Nogueira Batista Jr João Carlos Loebens João Lanari Bo Gilberto Lopes Dennis Oliveira Luis Felipe Miguel Marcelo Guimarães Lima Luiz Werneck Vianna Dênis de Moraes Priscila Figueiredo Manuel Domingos Neto Lincoln Secco Jorge Branco Slavoj Žižek Leonardo Avritzer José Geraldo Couto Thomas Piketty Bernardo Ricupero Tales Ab'Sáber Salem Nasser Henry Burnett Francisco de Oliveira Barros Júnior Luiz Renato Martins Jorge Luiz Souto Maior

NOVAS PUBLICAÇÕES